Eis que 200 anos depois… - por Núbia Pires
- Start Comunicação
- 25 de jul. de 2024
- 3 min de leitura

Vivenciamos uma cidade em (re) construção. Certeza absoluta que em 1824 não se imaginava que o “Sinos” abraçaria a cidade com toda a força do mundo, engolindo bairros inteiros e deixando um rastro de destruição e lástima. Não se imaginava que ruas tornar-se-iam rios e que as avenidas seriam destinadas a barcos e botes. Jamais em seus sonhos os descendentes passariam por tais penúrias, essas que nem em tempo de colonização se vivenciou.
Os alemães que aqui chegaram, assim como os que aqui restaram, tiveram que unir forças para levantar São Leopoldo. É como se o passado e o presente se reencontrassem para mostrar que 200 anos depois nada somos se não nos unirmos para concretizar um sonho que outrora era construir e agora reconstruir.
Duzentos anos de uma história talhada com suor e esforços, 200 anos de trabalho e luta, 200 anos de garra e sabedoria, 200 anos em que famílias povoaram e outras tantas repovoaram. Duzentos anos separam uma São Leopoldo tradicional e provinciana de uma cidade tão prospectiva e desenvolta. O mundo mudou, o planeta se desenvolveu, mas o “Senadinho” continua ali, recebendo as histórias e rememorando bons tempos que ficaram na lembrança de um povo que ainda se encontra para rememorar fofocas de figuras tão célebres que compunham o cenário dessa cidade.
Certeza absoluta que a Jacobina [Maurer] jamais imaginou que 200 anos depois a cuca seria recheada com Nutella e que o Apfelstrudel poderia ter outros ingredientes que não maçã. Certeza absoluta que os 39 primeiros imigrantes alemães (família Timm, Kramer, Hammel, Gross entre outros) nunca, nem em seus mais remotos delírios, pensaram que São Leopoldo teria um polo industrial composto por grandes empresas e nem uma universidade do tamanho da nossa, com um complexo tecnológico de dar inveja a grandes cidades. Certeza mesmo que os Muckers nunca imaginaram que em 2024 estaríamos com uma obra enorme na principal rua da cidade, e que para embelezá-la teríamos que esconder os fios de luz e Internet. Fios esses que sequer conceberiam que existiria um dia.
Se somente por um dia, um daqueles 39 que aqui chegaram pudessem visualizar o entorno da rodoviária lá pelas 18h30min, talvez se arrependessem de ter colonizado. Não entenderiam como duas pistas de carro se afunilam em duas pistas na entrada da cidade e porque as pessoas perdem até uma hora para chegarem aos bairros de São Leopoldo. Mas só quem vive aqui entende. Vale a pena.
Vale a pena o trânsito trancado, vale a pena as filas na “Modinha Brás”, vale a pena as calçadas apequenadas pela obra, vale a pena o buraco da Rua Grande. É lindo de se ver o orgulho desse povo de ter sobrevivido, resistido e reconstruído uma cidade carimbada pelas marcas das enchentes que enfrentaram, tanto em 1941, em 1965, em 2024…
Em 200 anos o futuro engoliu o passado, as gêmeas que esmolavam junto à rodoviária e proferiam lindas palavras quando não recebiam uma moeda já não são mais vistas. Em 200 anos a Feitoria do Linho Cânhamo virou uma cidade resplandecente. A Casa do Imigrante ruiu, o Sinos ecoou, Padre Réus orou, São Leopoldo se superou.
Em 200 anos somos um povo totalmente diferente e totalmente igual àqueles 39 que em 25 de julho de 1824 ocuparam essas terras. Formamos uma corte com etnias raciais, um povo com gêneros diferentes, com várias cores e sem títulos, mas que carrega consigo um antepassado de luta e orgulho que atravessa gerações e que tem a honra e a glória de ter nascido Capilé.

*Núbia Pires é advogada.
Comments