A verdadeira história de quem faz aniversário em Dezembro - Por Nana Vier
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Fazer aniversário perto do Natal é uma experiência que deveria vir com manual de instruções, aviso em letras garrafais e, se possível, um suporte emocional incluso. Eu faço no dia 18 de dezembro, exatamente uma semana antes da grande data. Sete dias que, no calendário, parecem inofensivos, mas na vida real funcionam como um aviso silencioso: não crie muitas expectativas.
Poucas vezes consegui fazer festa como manda o figurino. Reunir amigos, juntar família, marcar data com antecedência. Dezembro é um mês que não cabe ninguém. As agendas estão cheias, os bolsos fazendo contas com o décimo terceiro, as cabeças girando entre encerramentos, confraternizações e listas de supermercado. Todo mundo até quer, mas poucos conseguem. E assim a gente aprende cedo que dezembro não perdoa aniversariantes.
Na infância, isso doía mais. Eu sempre ganhava um único presente. Minha mãe explicava, com toda a doçura possível, que seria um presente BOM. Um presente que valeria pelo aniversário e pelo Natal. Um combo afetivo. Um dois em um emocional. Eu aceitava, mas observava. Depois chegaram minhas irmãs. E com elas, a prova material da desigualdade: elas ganhavam presente de aniversário e presente de Natal. Separados. Claros. Inquestionáveis.
Até que um dia fiz uma proposta madura, justa e absolutamente visionária: não queria mais um presente bom. Queria dois RUINS. Parecia lógico. Era. Afinal, eu não disputava espaço com qualquer pessoa. Eu dividia a data com um nascimento que atravessa séculos, que reorganiza o tempo e silencia qualquer vaidade individual: o do Menino Jesus. E tentar existir nesse intervalo sagrado, onde a cidade se ilumina, as vozes cantam, as mesas se ampliam e o mundo inteiro parece respirar outra frequência, não é tarefa simples para uma criança comum que só queria soprar velas e ser vista por um instante.
Cresci. A ferida virou característica. Ainda fico chateada quando esquecem? Fico. As correrias de fim de ano ajudam a apagar datas. Hoje, pelo menos, ficou mais difícil esquecer: as redes sociais anunciam o aniversário como quem diz “ela existe, é hoje”. Bendito algoritmo que confirma minha existência uma vez por ano, entre um anúncio de panetone e outro de promoção.
Mas nem tudo é perda. Fazer aniversário em dezembro também tem vantagens. A cidade inteira está iluminada, decorada, bonita. Minha casa já está pronta para a festa, com árvore montada, luzes piscando e cheiro de Natal no ar. Não preciso enfeitar nada: o cenário vem pronto. Há uma sensação de encerramento, de ciclo, de balanço. Como se a vida dissesse: fecha esse ano com gratidão, aprende com ele e segue.
Existe ainda um privilégio silencioso. Fazer aniversário em dezembro ensina cedo sobre espera, sobre dividir, sobre compreender o outro. Talvez por isso a gente cresça mais tolerante, mais sensível, mais consciente de que nem tudo gira ao nosso redor mesmo quando, convenhamos, deveria ser o nosso dia.
As desvantagens são claras: dividir atenção, dividir datas, dividir presentes, dividir afeto. As vantagens também: celebrar cercada de luz, símbolos, encontros e esperança. No fim, aprendi que os amigos verdadeiros lembram sem notificação. E a família, essa minha fortaleza, sustenta o que o calendário insiste em fragilizar, mesmo quando o tempo é curto.
Mesmo assim ou talvez por isso mesmo eu amo fazer aniversário. Aviso a todos que o dia está chegando. Não por cobrança, mas por celebração. Porque estar viva, inteira, lúcida o suficiente para comemorar mais um ano é uma bênção. E se for para dividir o brilho com o Natal, que seja. Há luz suficiente para todos. Inclusive para quem faz aniversário em dezembro. E isso, também é presente.

Nana Vier, é professora e escritora































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