As Emancipações dos Distritos de São Leopoldo - 2ª Parte
A programação da feira foi amplamente divulgada através da iniciativa de uma comissão organizadora que se esmerava para que o evento transcorresse de forma impecável. No material de divulgação, impresso e distribuído com bastante antecedência em relação ao início do evento, consta a programação do período de 20 de setembro e 5 de outubro, definindo um conjunto de atividades entre as 6 horas da manhã até às 21 horas da noite. A disponibilidade de hotéis e restaurantes também foi divulgada, mostrando o grau de profissionalismo dos organizadores do evento, que buscou evitar problemas e tornar o contexto o mais agradável possível para os visitantes.
Presença do Presidente do Rio Grande do Sul, Antônio Augusto Borges de Medeiros, na Exposição Industrial de 1924, em Novo Hamburgo. Na foto também estão Dr. Jacob kroeff Neto (deputado estadual e industrialista), Carlos Dienstbach, Capitão Bidan (redator-secretário do jornal “A Federação”) e Major Adalberto Pereira.
De fato, na finalização dos festejos, no dia 5 de outubro de 1924, aconteceu a Batalha das Flores: dezenas de automóveis enfeitados com arranjos florais fizeram um desfile pelo centro da vila, culminando com a concentração no local da exposição. Muito além de uma demonstração de força econômica, a exposição de 1924 fez parte da estratégia de um grupo que buscava maior autonomia para a gestão de sua comunidade e de seus negócios, com o objetivo de conseguir a separação de Novo Hamburgo de São Leopoldo e a sua consequente emancipação.
Estes argumentos fortaleceram os discursos pró-emancipação. Já no início da década de 1920 se formou uma Comissão Pró-Emancipação, da qual faziam parte expoentes locais como Pedro Adams Filho, Jacob Kroeff Netto, Leopoldo Petry, André Kilpp, Júlio Kunz, José João Martins e Carlos Dienstbach.
O movimento emancipacionista de Novo Hamburgo pode ser considerado a primeira iniciativa da formação de uma identidade para a cidade, pois foi a série de acontecimentos relacionados à emancipação que fez com que a comunidade sentisse a necessidade de afirmar-se em contraposição ao município-sede, São Leopoldo. As iniciativas e estratégias necessariamente tiveram que aproximar católicos e evangélicos-protestantes com os partidos republicanos e com a oposição, identificados, a partir da década de 1920, com os libertadores (e anteriormente com os federalistas). Essa relação entre política e religião é intrínseca e bastante intensa em Novo Hamburgo naqueles anos 1920.
Os protagonistas que se empenharam pela emancipação da localidade, além da filiação partidária, mostravam forte engajamento dentro das suas respectivas instituições religiosas. Nesse sentido fica notório que, para alcançar o objetivo maior, se fez necessária uma trégua das disputas religiosas e políticas locais. Mas o fato é que São Leopoldo não podia abrir mão de seu 2º distrito naquele momento, um grande gerador de impostos. Até porque o intendente João Corrêa Ferreira da Silva tinha contraído pesados empréstimos para executar seu audacioso projeto de ampliação da eletrificação de São Leopoldo, a Usina Hidrelétrica da Toca. Essa usina seria inaugurada somente em 1930, na gestão de Theodomiro Porto da Fonseca. Mas as questões relacionadas a investimentos na área da geração de energia elétrica para impulsionar as indústrias faziam parte das acaloradas discussões e das estratégias envolvendo a emancipação de Novo Hamburgo.
Sob certo aspecto, Corrêa foi habilidoso: ao prever que perderia Novo Hamburgo, pelo menos assegurou a permanência de Campo Bom como distrito de São Leopoldo. Os futuros problemas econômicos seriam menores, pois Campo Bom também proporcionava um bom retorno em termos de impostos.
No ano de 1926, Campo Bom integrava a área do 2º distrito (que abrangia também Novo Hamburgo e Hamburgo Velho). Para evitar uma queda de receita muito acentuada, com a perda das localidades que mais geravam impostos e rendas, Corrêa entrou em acordo com o líder campo-bonense Gustavo Vetter, e criou o 10º distrito de São Leopoldo. Para a sub-intendência do novo distrito, foi nomeado o genro de Vetter. Através dessa manobra política, Corrêa conseguiu minimizar prejuízos futuros, garantindo a permanência de ao menos um de seus mais lucrativos distritos.
O fato é que João Corrêa Ferreira da Silva foi uma proeminente liderança empresarial e política de vanguarda. Antes de ser intendente de São Leopoldo, João Corrêa conseguiu, em 22 de setembro de 1911, a concessão para implantação da linha férrea ao Morro de Paula, local de exploração de pedras para construção. João Corrêa teve a percepção de que, nos anos vindouros, São Leopoldo consumiria grande quantidade de pedras, tanto para a construção do futuro cais, como para o calçamento de ruas, cordões e calçadas. Conforme nota no jornal “O Regimen” em 9 de março de 1912,
"devem ficar concluídos, por estes poucos dias, os trabalhos da estrada de ferro, mandada construir pelo nosso amigo Cel. João Corrêa da Silva, e que, partindo desta cidade, onde entronca na linha da viação Férrea do Rio Grande do Sul, vai terminar na Fazenda São Borja, no Morro de Paula”.
Nesse local já tinha sido extraída enorme quantidade de pedra grês, havendo encomenda antecipada de 600 vagões. Inclusive, na época havia também grande demanda dessa pedra, extraída da Pedreira São Borja, para Porto Alegre.
O mesmo jornal traz notícia, na edição de 23 de outubro de 1912, de passeio promovido pelo nosso empreendedor, em direção ao Morro de Paula, “um aprazível lugar servido por uma linha férrea que acessa a pedreira que os mesmos senhores ali possuem e exploram”. O público que desfrutou daquela excursão eram:
“inúmeros cavalheiros e excelentíssimas famílias, todos sedentos do gozo daquele ar puríssimo e da água cristalina daquelas paragens. (...) No alto cume do morro, lugar pitoresco por excelência, em ótimo capão, havia suculento churrasco, bebidas e café. O dia passou-se célere, por entre as mais francas expressões de alegria. Pelas 5 horas da tarde operou-se o embarque e não tardou que a locomotiva desse o sinal de partida. Na passagem do trem os moradores daquela região colonial acenavam os lenços. Uma orquestra executava bonitas peças de seu repertório e não tardou a chegada do comboio à estação desta cidade”.
Fonte: Histórias de São Leopoldo: dos povos originários às emancipações, de Felipe Kuhn Braun e Sandro Blume/ Pesquisa Bado Jacoby
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