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'Você não será substituído pela IA': por que você deveria desconfiar disso


A Microsoft fez uma demissão em massa que afetou mais de 6 mil funcionários nesta semana. Mesmo sendo uma das líderes no desenvolvimento de produtos de IA e com um lucro trimestral acima do esperado, a empresa passou por uma reorganização em busca de mais eficiência.


Lembrei imediatamente da frase mais clichê do mundo da tecnologia na atualidade: "você não será substituído por uma IA, mas por alguém usando IA". Em todo evento não falta alguém para soltar essa resposta pronta quando é perguntado se a tecnologia irá tirar nossos empregos.


Você já deve ter ouvido isso - ou até mesmo falado. Esse discurso pode ter feito sentido com a chegada acachapante do ChatGPT, funcionando como um recado para as pessoas: é bom se preparar, porque alguém usando a IA pode fazer o seu serviço com mais velocidade e qualidade. Hoje, saber usar IA como usuário final está se tornando uma competência digital básica, assim como usar um editor de texto ou uma planilha.


Porém, continuar repetindo a famosa frase como se fosse um mantra é algo limitador. Se essa for a resposta padrão toda vez que alguém questionar se a IA vai abalar o mercado de trabalho, perdemos a chance de aprofundar a análise e expandir o debate para toda sociedade do impacto da tecnologia. Porque, no fim, a IA tem potencial para trazer uma mudança significativa na força de trabalho, causando deslocamento de postos de trabalho e desemprego.


Um estudo feito no ano passado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), por exemplo, mostrou que 40% dos postos de trabalho em todo o mundo já estão expostos à IA. Embora uma parte dos profissionais possa se beneficiar, a outra será prejudicada e até mesmo substituída.


Não dá para cravar qual o real efeito na economia no longo prazo, até porque não temos consenso sobre isso. Enquanto algumas estimativas afirmam que a IA pode dobrar a taxa de crescimento, o prêmio Nobel em Economia Daron Acemoglu argumenta que a IA vai trazer um aumento modesto, entre 1,1 a 1,6 do PIB, ou um ganho anual de produtividade de apenas 0,05 por cento.


Mas ainda que não tenhamos certeza sobre projeções de médio e longo prazo, pesquisas experimentais mostram um aumento significativo de produtividade e eficiência quando trabalhadores começam a usar ferramentas de IA em suas tarefas de escritório. Um estudo recente realizado por pesquisadores da Harvard Business School e The Wharton School demonstrou que os funcionários que usam IA gastam 16% menos tempo para concluir algumas tarefas em relação àqueles sem o uso da tecnologia.


Você mesmo pode ter exemplos anedóticos de atividades que está fazendo com mais velocidade e qualidade depois que passou a adotar IA. Talvez verificar um contrato, preparar uma planilha, analisar um documento ou até produzir um conteúdo. É um aumento de produtividade evidente, mas que não vem sem perturbações para o mercado de trabalho.


No livro "Poder e Progresso", Daron Acomeglu e Simon Johnson contam que o aumento da produtividade não se traduz obrigatoriamente em uma maior demanda por trabalhadores. É o avanço da tecnologia que pode causar esses efeitos, sem a necessidade de contratação de novos funcionários.


A busca pela eficiência deve então causar uma diminuição na oferta de postos de trabalhos. Não estou dizendo que a IA vai sumir com profissões como um todo no médio prazo, mas se uma empresa consegue fazer mais com menos, é assim que vai ser.


Foi o que aconteceu com a Microsoft, por exemplo. Vi, inclusive, que uma diretora de IA foi uma das afetadas. Certamente, ela não foi substituída por desconhecer a tecnologia, mas como resultado de uma mudança no paradigma de produtividade que a IA trará para todos - inclusive para mim e para você, caro leitor, especialmente com a promessa das chegadas dos Agentes de IA.


O deslocamento de ocupações, como mostrado por relatórios do FMI e do Fórum Econômico Mundial, é uma tendência real. E não adianta esconder essas rupturas atrás de frases de efeitos que funcionam bem no palco, mas não resistem ao teste da realidade. Se continuarmos tratando os impactos da IA apenas como uma questão de adaptação individual, corremos o risco de negligenciar as responsabilidades coletivas.


Precisamos ter conversas difíceis e falar sobre cenários futuros incertos, políticas públicas e proteção social. Caso contrário, corremos o risco de ver a humanidade cada vez mais dividida em duas castas: uma minoria economicamente ativa e uma maioria economicamente descartável.


FONTE: PORTAL UOL \ Opinião de Diogo Coriz

FOTO: Getty Images/iStockphoto

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