É mais fácil sobreviver a uma pandemia que publicar livro no Brasil - Por Magali Schmitt
- Start Comunicação 
- 13 de out.
- 3 min de leitura
Quando a pandemia começou eu era a única pessoa do meu núcleo familiar que saía de casa, para ir voando ao supermercado e só. Onde mais? Lembro como me sentia aterrorizada andando pelos corredores vendo um punhado de mascarados, assim como eu, empurrando carrinhos em que muitos outros tinham colocado a mão antes.
Eu havia assistido a uma animação de como o vírus se espalhava por qualquer coisa, superfície, parede ou pelo ar e de como não havia o que se pudesse fazer depois do contato. Obrigada a você que criou esse vídeo. Por sua causa vivi momentos de pânico acreditando que toda ida ao supermercado era o fim anunciado e que eu poderia levar para dentro de casa a COVID-19.
Por outro lado, não queimei caloria lavando compras, tirando toda a roupa na garagem, me escovando de cima abaixo. Para quê, se o vídeo havia alertado que era tempo perdido? Nos primeiros dias do isolamento um amigo disse que era coisa para três ou quatro meses. Que lá por julho tudo estaria normalizado. Julho?! Aquilo soou como uma sentença de morte e pensei com os meus botões “ele está doido, fora do juízo, em duas semanas já vamos estar borboleteando ao sol novamente”.
A minha convicção de que passaria rápido foi sendo soterrada dia a dia, equivocada como costumam ser todas as certezas. Me agarrei à escrita. Depois que tudo mais ou menos se organizou, consegui botar meu cérebro descarrilado nos trilhos. Mais ainda precisava canalizar aquela energia para algum lugar. A escrita, para mim, é esse lugar. Foi assim que apaziguei a mente e dei asas ao meu primeiro romance, sobrevivendo, mais ou menos ilesa, sem nunca ter tido a doença.
A pandemia acabou, o mundo voltou ao normal e o meu romance ainda não estreou. Daquelas voltas loucas que o mundo dá. O que leva a concluir que é mais fácil sobreviver a uma pandemia que publicar livro no Brasil! É verdade. Um mercado competitivo, essencialmente masculino, com cada vez menos espaço. E olha que tem bastante gente escrevendo coisa boa por aí. Mas como vivemos na era do instagramável, que não tem alguns bons milhares de seguidores nas redes sociais não tem vez com as chamadas grandes editoras.
Mas parece que há uma luz no fim do túnel. Esse pessoal aí que estuda e faz pesquisa e observa as tendências já cantou a pedra de que o povo está passando cada vez menos tempo nas redes sociais, perdendo o interesse ou algo parecido, porque o outro povo deixou de compartilhar sua vida pessoal. Que as redes estão viradas em propaganda e perderam a graça. Ou seja, o que rende mesmo é bisbilhotar a vida alheia. Porque a grama do vizinho é sempre mais verde.
Isso pode significar que a literatura, talvez, quem sabe, possa voltar a ser uma forma relevante de conexão. Afinal, um bom livro pode proporcionar tudo e muito mais que as redes sociais. Embora ler esteja em desuso, é preciso salientar que os livros têm uma tecnologia incrível embarcada. Dá para acessá-los em qualquer lugar, independente se há energia ou não, nunca ficam sem sinal e funcionam sem bateria. Querem mais vantagens do que essas? Você paga uma vez só e tem acesso ilimitado. E a maior de todas: dá para bisbilhotar à vontade, com ou sem pudor, viajar por mundos incríveis e não ser julgado, muito menos cancelado. É um bom negócio, pode apostar. E os autores agradecem.
A propósito: meu romance se chama A Casa da Torre e vocês ainda vão ouvir falar nele.

Magali Schmitt, é jornalista e escritora.

































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