A febre de opinar - Por Nana Vier
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- 9 de nov.
- 3 min de leitura
Dia desses, conversava com uma amiga que me contava uma situação vivida em sua família que, para mim, parecia simples de resolver. “Para mim” veja bem que carrego a minha própria história, feita de tropeços e recomeços, de erros que me ensinaram mais que os acertos, de dores que me deram casca e de escolhas que, mesmo quando não deram certo, me deixaram mais humana e um pouco mais sábia.
Ouvi atentamente. E, em alguns momentos, confesso, a vontade de opinar coçava a língua. Sabe aquele instante em que a pessoa toma fôlego, faz uma breve pausa, e o silêncio parece um convite? Pois é. O corpo já se prepara pra falar, a mente ensaia a frase perfeita — e, de repente, ela retoma o fôlego e segue.
E ainda bem.
Tenho me esforçado para isso: ouvir sem precisar responder. Sempre fui muito falante. Daquelas que interrompem por empolgação, acreditando estar ajudando, quando na verdade estão apenas roubando o tempo de quem ainda não terminou. Um hábito feio, aprendi. Feio e comum. Descobri que mais gente do que eu imaginava sofre dessa pressa de preencher o silêncio com palavras.
Minha amiga falou, desabafou, e quando terminou ficou me olhando com aquele olhar que pede consolo ou conselho. Esperava, claro, que eu dissesse algo — qualquer coisa. Sempre fui assim: tinha resposta pra tudo, quase soluções mágicas, uma verdadeira coaching da vida alheia. Mas, naquele dia, percebi que talvez a melhor resposta fosse justamente não ter nenhuma.
Ela me olhou surpresa, quase sem acreditar. Esperava pelo menos uma palavra, um conselho, quem sabe até uma das minhas piadas para quebrar o clima — afinal, sempre fui boa nisso, em transformar tensão em riso. Mas dessa vez, fiquei quieta. Ela riu, eu também. E ficamos um tempo em silêncio. Um silêncio bonito, que não era vazio, mas cheio de presença. Foi quando percebi que o que ela precisava não era de uma opinião. Era só ser ouvida.
Vivemos um tempo curioso: a “febre de opinar”. Todo mundo precisa ter uma opinião sobre tudo — política, moda, religião, guerra, dieta, educação dos filhos, o comportamento dos pets e até sobre o segredo do arroz perfeito. A gente lê uma manchete e já publica uma tese. O mundo virou um grande programa de auditório em que cada um quer segurar o microfone por cinco segundos.
Mas será que precisamos mesmo pensar em voz alta o tempo todo?
Será que o silêncio também não é uma forma de sabedoria?
O silêncio, às vezes, é um gesto de amor. Um modo de dizer “estou aqui” sem precisar dizer nada. É o espaço onde o outro pode se escutar.
Opinar é fácil; escutar exige humildade. E talvez por isso seja tão raro.
Tenho aprendido que o mundo não precisa da minha opinião o tempo inteiro. Precisa da minha escuta. Do meu olhar. Da minha pausa. Às vezes, o melhor que a gente pode oferecer é o vazio que permite ao outro se encontrar. E, olha, não é fácil. A gente se acostuma a preencher silêncios, a achar que precisa resolver o que, muitas vezes, só precisa ser acolhido. Ficar quieta é quase um exercício de fé — acreditar que o tempo, a vida e o outro saberão encontrar as respostas sem a nossa interferência.
Há uma sabedoria antiga nisso: o tempo faz o trabalho que a pressa não permite. A dúvida é o terreno fértil da reflexão. A gente não precisa saber tudo, nem ter respostas imediatas — e tudo bem.
Não opinar o tempo todo não é omissão. É respeito.
No fim das contas, saí daquele encontro mais leve. Porque, pela primeira vez, consegui ser apenas presença.
E talvez, no meio dessa confusão de vozes e certezas instantâneas, seja isso o que mais anda faltando: alguém que escute de verdade, sem precisar vencer o debate.

Nana Vier, é Professora e escritora































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