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Por que somos fascinados pelo Natal? - Por Nana Vier

Talvez porque ele não mora no calendário, mas dentro da gente. Para alguns, o encanto começa antes mesmo de dezembro: basta o primeiro brilho em uma vitrine, o cheiro de biscoito saindo do forno ou aquela música natalina que surge do nada. É novembro, e o coração já muda de compasso. Aqui no Rio Grande do Sul, por exemplo, vivemos à espera do dia em que o Zaffari lança sua campanha, aquele instante em que choramos sem entender o motivo, e ainda assim nos sentimos transbordando ternura.


Nem bem chegou novembro e eu já estou decorando minha casa. Parece que quero viver o máximo de tempo possível dentro das cores, das luzes e dos encantos que o Natal proporciona. Cada guirlanda, cada laço e cada pisca-pisca me fazem acreditar que a alegria pode, sim, ser montada em partes e que, com o toque certo, até o coração se ilumina.


Entendo que nem todo mundo se derrete por essa época como eu. Há quem prefira o silêncio, quem atravesse o mês sem piscar diante de uma luzinha sequer. E tudo bem. Cada pessoa vive o Natal à sua maneira. Uns na algazarra das mesas cheias, outros no recolhimento manso do coração. Talvez aí esteja a graça: ele não cobra nada, apenas se oferece como um convite a sentir.


E então, quando menos esperamos, chegam os filmes natalinos. Aqueles que se passam em vilas de contos de fadas, sempre cobertas por uma neve que nunca derrete, com personagens que encontram o amor e um chocolate quente em cada esquina. Histórias previsíveis? Sim. Mas quem resiste? São como cobertores afetivos: a gente sabe exatamente o que vai acontecer e, mesmo assim, torce pelo final feliz e chora, claro, sem culpa.


Essa época também desperta a vontade de repetir gestos antigos. As cores vivas, o cheirinho de casa limpa, as receitas que só aparecem em dezembro, o figurino combinado da família, o riso que antecede o reencontro. Montar a árvore é quase um exercício de memória: cada enfeite carrega uma história, cada pisca-pisca acende lembranças que o tempo tentou apagar. E, no meio de tudo isso, permanece o sentido espiritual: lembrar o nascimento de Jesus, ainda que as datas se percam nas discussões, o momento é reavivar a esperança, a fé e a capacidade de doar-se sem esperar retorno.


Na minha infância, o Natal nunca seguia o mesmo roteiro. O trabalho do meu pai nos fazia trocar de endereço constantemente. Em alguns anos, a casa parecia saída de um filme; em outros, o pinheirinho ficava esquecido em alguma caixa marcada “urgente”. Minha mãe, exausta das madrugadas na máquina de costura, nem sempre tinha ânimo para inventar a magia que a data pedia. Mesmo assim, havia calor. Como se a intenção bastasse.


Recordo o primeiro Natal que organizei sozinha. Eu tinha dezesseis anos, meu primeiro salário e o 13º que parecia um prêmio da loteria. Gastei tudo em presentes para as minhas irmãs pequenas e em enfeites comprados com o entusiasmo de quem inaugura uma tradição. Não era sobre consumo, era sobre criar abrigo. Fazer da casa qualquer que fosse, um lugar de permanência.


Hoje, meus pais já partiram, e a minha casa virou o ponto de encontro, quase o endereço oficial das minhas irmãs e sobrinhos. Minha filha, que mora fora do país, faz questão de vir todos os anos. E, antes mesmo de embarcar, já enfeita o próprio lar, como se o espírito natalino se recusasse a esperar. Criamos lembranças antes mesmo que aconteçam. E cada detalhe, das luzes ao cardápio, carrega o carinho de quem entende que celebrar é, acima de tudo, acolher.


Por que, afinal, essa fascinação? Talvez porque o Natal devolva a sensação de pertencimento. Talvez porque desperte a criança adormecida em nós. Ou porque, por um breve instante, o mundo parece mais possível, mais humano, mais bonito. Essa data reconstrói o que a rotina desgasta. Lembra-nos do essencial: gente reunida, comida simples, afeto em abundância.


No fim das contas, o Natal é isso: uma boa desculpa para reacender o melhor que existe em nós. E, se alguém tiver uma explicação melhor, que me conte. Eu continuo fascinada e agradecida por tudo o que essa época ainda desperta.


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Nana Vier, é Professora e escritora

 

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