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Quando Flaubert foi aos tribunais para responder por sua "indecente" obra “Madame Bovary”


Ao longo da história, diversos livros foram proibidos ou seus autores enfrentaram processos por causa do conteúdo abordado. Obras como “Ulysses”, de James Joyce, “O amante de Lady Chatterley”, de D. H. Lawrence, “As flores do mal”, de Charles Baudelaire e “Madame Bovary”, de Gustave Flaubert, fazem parte dessa lista.

Publicado em 1857, “Madame Bovary” marca o início do Realismo francês e se tornou o livro mais conhecido de Gustave Flaubert, a obra também lhe rendeu um processo, sendo qualificada pelo juiz que julgou o caso como imoral, contrária “aos bons costumes e às instituições” e tomada de “imagens que o bom gosto reprova”.

Tendo como protagonista Emma Bovary, Flaubert faz uma crítica à vida provinciana, ao clero e à moral burguesa. Emma é uma jovem criada no campo e educada em um convento, cujo grande passatempo era ler romances e sonhar com o dia em que abandonaria aquela vida campestre e passaria a viver intensamente em Paris.

No intuito de realizar seu sonho, ela se casa com o médico Charles Bovary, mas, embora ele a amasse e a tratasse com carinho, era alguém sem ambições, que não visava a vida de luxo com a qual Emma sonhava. Assim, a jovem vai ficando entediada e frustrada com seu casamento, nem mesmo o nascimento de sua filha Bert ou a mudança para uma outra cidade a tornam mais feliz e ela acaba traindo seu marido, buscando no amante a vida de aventuras com a qual sonhava.

Cena do filme “Madame Bovary”Seu amante, no entanto, vai embora e deixa Emma para trás, atolada de dívidas e gravemente doente. Algum tempo depois, ela apaixona-se pelo jovem Leon e embarca em um novo relacionamento amoroso. Mais uma vez, a jovem não se vê plenamente realizada e as dívidas que havia contraído a deixam desesperada, pois já não sabe mais como escondê-las do marido. Desesperada e sem a menor perspectiva de satisfazer plenamente seus sonhos, Emma toma veneno e morre. Charles só descobre as traições da esposa e a gravidade das dívidas que ela fizera depois de sua morte. Na miséria e totalmente abalado pelo golpe que sofrera, Charles acaba morrendo após um período doente, sua filha Bert vai viver com uma tia e passa a trabalhar para garantir seu sustento.

Publicada primeiramente em folhetim na revista “Revue de Paris”, “Madame Bovary” não só serviu de modelo para diversas outras obras realistas produzidas em diferentes países, como rendeu um processo ao seu autor e ao editor da revista na qual foi publicada.

Flaubert foi absolvido pela Sexta Corte Correcional do Tribunal do Sena, mas recebeu inúmeras críticas daqueles que viam uma grande imoralidade em uma obra que tematizava o adultério de forma tão explícita e sem florear a realidade. Durante o julgamento, ao ser questionado sobre em quem se inspirara para criar a personagem Emma, Flaubert disse sua célebre frase: “Madame Bovary sou eu”.

Apesar de todo o escândalo gerado pelo livro e pela enorme repercussão do julgamento de seu autor, Gustave Flaubert foi absolvido da acusação de escrever uma obra “execrável sob o ponto de vista moral”, porém ouviu duras críticas do juiz e da acusação. Conforme o juiz do caso, “Há limites que a literatura, mesmo a mais ligeira, não deve ultrapassar, de que Gustave Flaubert e seus coinculpados não se deram conta”. Justamente por não se prender a esses limites esperados na época é que “Madame Bovary” tornou-se um grande clássico da literatura universal e uma importante precursora do romance realista, abrindo caminho para que adultério se tornasse um tema importante nas obras desse período e permitisse tanto à crítica à mentalidade romântica à qual o Realismo se opõe quanto à moral burguesa.


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